terça-feira, 29 de julho de 2014

"O que sente?"

Quem já não se deparou com os mal-estares da alma? E quem já não procurou ajuda para saná-los? Aquele homem não era só mais um, era alguém que precisava desabafar o que tanto lhe incomodava por dias a fio.

Interior de uma cidadezinha pequena já no nome. Seguiu as ruas de terra na esperança de o médico tirar-lhe as dúvidas. Espera impaciente pelo encontro que talvez mudasse a vida, passava o tempo lentamente contando as horas pelo sol que ficava cada vez mais alto.

“O senhor, por favor, venha por aqui”. Encontrava-se, depois de sabe lá quanto tempo, com a resposta para as suas perguntas mais viscerais.   

“O que sente?”, perguntou o médico, em seu ofício cotidiano de entrevistador.  

“Ó, doutor. É uma alegria que sobe e quando chega na cabeça só me vem o tempo de menino. E isso só acontece quando tem lua cheia, desde que um piolho de cobra picou meu dedão do pé”.

E o silêncio pairou pelo consultório, um ar risível no ambiente. E nada que a medicina mais moderna pudesse explicar, nada que os estudiosos mais renomados pudessem dizer.

“Se é alegria, melhor não mexer”, concluiu o médico no alto de sua sapiência. E o rapaz saiu de lá, satisfeito por seu problema ser o que tanta gente procura. 

quarta-feira, 23 de julho de 2014

O que foi...


Era apenas um corredor por onde passavam fantasmas,
por onde caminhavam as lembranças,
depois de adormecidas as saudades.
Eram as janelas entristecidas
por terem os olhos fechados para o tempo que veio,
com tons e cores que sequer foram vistos.
Eram os móveis empoeirados,
carregados de histórias não mais contadas,
ignorados em seus defeitos nunca reparados,
acumulando pela simples função de acumular.
Eram as portas fechadas para o mundo.
Era o mundo fechado em si mesmo.
Era a água interrompida,
a luz acostumada à escuridão.
Era o jardim somente um punhado de terra seca,
eram as paredes reflexos da solidão.
Era o entardecer febril,
de passos trôpegos pelo vazio.
Era o silêncio, apenas.